A CAIXA DE PANDORA



A história que vamos contar passa-se no Olimpo, morada dos deuses, em uma época em que só existiam coisas boas. O céu estava sempre azul, os rios sempre limpos e claros, com peixinhos multicoloridos nadando alegremente. Das árvores frondosas pendiam cachos de frutas doces e deliciosas e as flores, sempre viçosas, enfeitavam o gramado de um verde-turquesa claro. As pessoas viviam felizes e desconheciam doenças e as tristezas próprias dos seres humanos, como inveja, preguiça, medo e intolerância, dentre tantas outras.

No Olimpo, quem reinava era Zeus, rei dos importais, “todo poderoso”, que tinha completo domínio não só sobre os animais e as plantas, mas também sobre todas as pessoas que habitavam a Terra. Até que nasceu Prometeu (que em grego quer dizer “premeditado”), que de todos os Titãs imortais era o mais esperto. Era defensor da humanidade e ensinou aos seres humanos, pobres mortais, o dom do pensamento, muitos ofícios e habilidades, dentre elas o estudo das estrelas e o seu uso para navegação.

Um belo dia Prometeu roubou o fogo do carro do Sol e levou-o para a terra, e depois ensinou a humanidade a usa-lo para se aquecer e cozinhar. Quando Zeus olhou para a Terra e viu o brilho das fogueiras, ficou muito abalado, temendo que, tendo o domínio do fogo, Prometeu viesse também a dominar o Olimpo. Resolveu subjuga-lo antes que fosse tarde demais.

Como a melhor forma de subjugar um homem é uma mulher, ele pediu ajuda para outros deuses, para criarem a mulher perfeita. A primeira chamada foi Afrodite, a deusa da beleza, que contribuiu moldando um rosto delicado enfeitado com olhos infinitamente azuis e cabelos negros e sedosos, e um corpo perfeito recoberto de pele macia.
Apolo deu-lhe voz de mel, bonita e suave.
Hermes, mensageiro dos deuses, tratou de ensinar-lhe como usar a bonita voz para convencer as pessoas.Por último:
Eros, deus do amor, ensinou-lhe técnicas de conquista às quais seria impossível resistir.
Seu nome: Pandora (que significa bem dotada) Aí estava a mais perfeita das mulheres que o Olimpo tinha visto.

No dia em que Pandora saiu para procurar Prometeu, Zeus entregou-lhe uma caixa construída de um material vermelho, brilhante e ao mesmo tempo macio, até então desconhecido. Era adornada com rosetas de ouro e pedras preciosas, mas o principal era que essa caixa, misteriosamente, exercia um encantamento que tornava quase impossível desviar os olhos dela.

E, com ar de seriedade, deu a Pandora as seguintes instruções:

- Sua tarefa é levar esta caixa a Prometeu. Para cumpri-la, não meça esforços. Você foi criada para isso! Somente ele deverá abri-la. Mesmo que isto demore muito, nunca deixe outra pessoa se aproximar da caixa. Somente Prometeu poderá lidar com seu conteúdo.

E lá se foi a insinuante Pandora com sua caixa, espalhando beleza e perfume por onde passava.

Prometeu ficou muito impressionado com a beleza da moça e sua conversa interessante, mas a caixa passou-lhe despercebida. E tampouco passou por sua cabeça a idéia de se encontrarem novamente ou pedi-la em casamento, conforme esperava Zeus.

O tempo foi passando e Prometeu, a julgar pelo seu comportamento e suas falas, havia-se esquecido de Pandora. O mesmo não aconteceu com Epimeteu (que em grego quer dizer o que pensa depois). Este, depois que colocou os olhos em Pandora, nunca mais pôde tira-la de sua cabeça. Sua beleza insinuante era presença constante em seus sonhos. E a misteriosa caixa aguçava a sua curiosidade ao ponto de que daria qualquer coisa para poder simplesmente toca-la.

Como Pandora não conseguia nada com Prometeu, julgou que poderia se aproveitar da paixão que Epimeteu tinha por ela e com ele se casar. Dessa forma teria mais chances de se aproximar do irmão e entregar-lhe a caixa. De qualquer maneira, a sua missão estaria cumprida.

Para colocar seu plano em ação, bastaram alguns olhares e Epimeteu julgou-se o mais feliz dos homens: além de ter a bela mulher que desejava, teria a chance de descobrir o conteúdo da caixa que ela cuidadosamente levava.

Após as bodas, celebradas com grande festa, Epimeteu pediu que Pandora lhe mostrasse a caixa e, nesse momento, ela revelou seu segredo:

- Você não pode abri-la, ela pertence a outra pessoa. Vou guarda-la em um cômodo seguro em nosso palácio, até que chegue o momento de entrega-la ao seu verdadeiro dono, que a abrirá, e assim todos saberemos o que ela contém.

Isto não seria fácil para o curioso rapaz: dia após dia ele parava na porta do quarto onde se encontrava a caixa e lá ficava admirando-a e imaginando o que ela conteria.
Após alguns meses, a ousadia fez com que Epimeteu entrasse no salão para mais de perto admirar os contornos da caixa e seus delicados desenhos, e ficar sonhando com o dia que seu misterioso dono aparecesse e revelasse o seu conteúdo.

- Mas que mal haveria se eu a tocasse? Eu não posso abri-la, mas tocá-la, certamente, eu posso.

E seu próximo passo, foi deleitar-se acariciando o tecido suave que revestia o objeto.

Sem que Pandora percebesse qualquer coisa, o salão que guardava sua caixa passou a ser o aposento preferido do marido, lá ele ficava horas acariciando e conversando baixinho com a caixa. Nos momentos de maior curiosidade ele arriscava abrir um pouquinho, outras vezes a sacudia, tentando escutar seus barulhos, sentir um odor, descobrir pelo menos uma pista.

Certo dia, ao fazer suas manobras costumeiras de revirar e abrir parte da caixa, uma fumaça preta começou a sair dela. Isto fez com que a curiosidade vencesse Epimeteu que, não resistindo mais , finalmente a abriu.

Um estampido ensurdecedor se fez ouvir por todo o palácio, e fez com que as pessoas começassem a chorar de dor. A fumaça que saia da caixa elevava-se grudenta ao teto e, lá chegando, transformava-se em monstros alados, pretos e fétidos, que saíam voando pelas janelas.

Esses pássaros invadiram todo o Olimpo, queimando as árvores e os gramados, fazendo as flores murchar, calando e matando os passarinhos. As pessoas começaram a adoecer e envelhecer. Com raiva umas das outras, passaram a brigar e a se matar entre si..

O que foi que eu fiz? Chorava Epimeteu, sentindo o seu corpo sujo e dolorido. Suas mãos rachadas e ensangüentadas não conseguiam achar a tampa da caixa para fecha-la e fazer parar de sair a maldita fumaça que estava empestando tudo e trazendo todo tipo de desgraça, antes desconhecida no Olimpo.

- Mais prudente seria que eu me matasse, pensou, pois sou o mais desgraçado dos homens e não sei mais o que fazer.
- Após ter devassado campos e pessoas, a fumaça começou a diminuir. No meio das ruínas do Palácio, sobre a lama espessa e gomosa, restava o pobre e arrependido Epimeteu. Finalmente, tudo acabou.
- Quando Epimeteu pôde controlar seus soluços desesperados, ouviu uma batida fraquinha dentro da caixa.
- Não pensou ele, desta vez não me deixarei levar pela curiosidade. Não quero nem saber o que ocorre dentro desta caixa infeliz.
- Toc, toc, toc, por favor, deixe-me sair!
- Que vozinha é essa? Que haverá ainda dentro dessa caixa?
- Toc, toc, toc, por favor, imploro, deixe-me sair. Não poderei fazer mal maior do que aquele que já foi causado!
- É, a voz tem razão, pensou Epimeteu, o que poderá acontecer de pior? E assim pensando, com as mãos trêmulas e ensangüentadas, abriu a caixa, tampando os olhos para não ver novamente a terrível fumaça.

Mas, para a sua surpresa, em lugar da fumaça mal cheirosa ele viu um clarão intenso, de um delicado e suave tom verde. Aos poucos, no interior da fumaça esverdeada, começou a se formar uma figura brilhante. Era uma mulher de expressão bondosa, vestida de esvoaçantes véus verdes e trazendo uma cesta nas mãos. Nela se encontravam minúsculos pacotinhos, também verdes, cada um deles brilhando com uma luz própria.

- Quem é você? Perguntou Epimeteu com a voz ainda trêmula.
- Eu sou a Esperança!
- Esperança, o que é isso?

- É aquela que aparece quando tudo parece desabar à sua volta, quando parece que o mundo vai terminar. É aquela com quem você sempre pode contar.

- Vocês não a conheciam, tinham tudo mas não tinham a esperança. A Caixa de Pandora trouxe a desgraça e a doença, mas junto com tudo isso, acabou trazendo a esperança. Não há mal suficiente para me barrar, eu sempre existirei e aparecerei para recomeçar e acreditar que tudo vai e pode melhorar!

Dizendo isso, ela ofereceu a sua cesta brilhante à Epimeteu e disse:

- Vá, distribua a esperança para seu povo. Estes homens conheceram os tormentos do mal, é hora de se alimentarem e se tornarem fortes para perseguirem novamente a felicidade!

Epimeteu se pôs em pé e seguiu, cheio de esperança, para cumprir as ordens da senhorita de verde.


Fim

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